“Video e Resistencia: Contra Documentarios”,

Texto-resumo do capítulo “Vídeo e Resistência: Contra Documentários”, do livro “Distúrbio Eletrônico – Critical Art Ensemble”.

Texto-resumo do capítulo “Vídeo e Resistência: Contra Documentários”, do livro “Distúrbio Eletrônico – Critical Art Ensemble”.

O vídeo nasceu em crise. O documentário, modelo recorrente de vídeo para a resistência, pode estar situado na persistência do modelo iluminista de verdade, conhecimento e realidade empírica. É a crença na tecnologia como testemunha factual, independente de uma subjetividade.

No iluminismo, tudo deveria ser observado, e tudo que fosse observável era dotado de uma expressão que remetia à verdade. Os sentidos humanos ganham importância com o empirismo. Esse pressuposto gerou a especialização e a divisão de conhecimentos como resposta ao fato de ter que se lidar com uma nova e gigantesca quantidade de dados.

Mas os sentidos foram desmentidos. A crítica do ceticismo ao romantismo, sob a bandeira do idealismo alemão, colocou os sentidos num campo em que não seriam mais portadores confiáveis de informação, uma vez que as percepções poderiam ser ou não fiéis às coisas em si. Por exemplo, a memória. Esta é, por excelência, uma diminuição da factualidade.

A ciência cai, então, em um espaço delicado no século XIX: legitimadora ideológica e proclamadora do que era real na experiência, não poderia dar conta do passado nesse mesmo sentido “real” apenas com escritos baseados na memória; Os registros escritos ou pintados são sempre parciais e duvidosos.

O problema viria a ser resolvido com uma inovação tecnológica: a fotografia. No início, ela foi usada muito mais como ferramenta científica do que estética. A partir dela, nem mesmo as tentativas de escritores e pintores realistas foram capazes de tomar o lugar então, satisfatório, da objetividade, da memória factual e do real. Na virada do século XIX para o XX, uma nova investida aparece: o filme. A técnica de encadear fotografias para dar a sensação de movimento entra em cena como uma ferramenta para registro objetivo visual e preciso da injustiça social e da resistência esquerdista. A empolgação com as novas possibilidades fez com que os filmes precedessem a reflexão crítica sobre o veículo, o que atrasou a análise profunda dos métodos de montagem e narração, e os equívocos continuam até o presente.

A factualidade era somente o peso da ideologia. As vidas apresentadas não eram vividas. A falta de instrumentos para edição faziam do filme um evento simulado, um entretenimento e uma amostra de uma cultura que nunca existiu, isolada de qualquer contexto histórico. O filme, nesse sentido, é um meio de comunicação gerador e impositor de significados. O documentário que pretende criar uma história rígida do presente se equivale ao que a Walt Disney faz com a cultura do “outro”, o sentimento do colonizador mostrando como bem entende os colonizados. A ficção e a não ficção convivendo simultaneamente e sendo admitida é o atestado de que a história é feita em Hollywood.

Os documentaristas, sob a metodologia científica, buscam normalmente ter autoridade através da exibição do “fato”, da certeza. Mas o método em si produz um caminho pré estabelecido, ou seja, uma trapaça ilusionista. Isso consiste em uma estrutura narrativa que envolve o espectador sem deixar espaços para possíveis outras interpretações que não seja a conclusiva estabelecida pelo autor/diretor. Inclusive, o fracasso de um documentário tradicional provém da descontinuidade na cadeia narrativa, ou seja, quando cria um espaço para descrença da montagem pensada.

Para evitar manipular o espectador e promover a liberdade de impressão é preciso trilhar um outro caminho, também limitado em suas características, mas que não seja esse herdado da tradição. A recusa da tradição e do método de narrativa de indução conclusiva e totalizante é normalmente o que o modelo dominante de produção chamaria de fracasso. Tal afirmação se baseia no fato de que as imagens sendo libertadas de uma narrativa pré estabelecida, tornando-se associativas e um convite à interpretação, tenderiam à dispersão do tema, à confusão e ao desinteresse do espectador. Ainda, permite uma fuga do objetivo ideológico inicial da produção, elemento que, por si só, já elimina possibilidades de investimentos monetários na produção, já que o tiro poderia sair pela culatra.

Poderíamos dizer que o espectador tem direito à divagação e ao desinteresse. Mas criar novos modelos para atender à ideia de filmes em estruturas que convidem a multiplicidades de interpretações, não deixa de também exigir e estabelecer uma metodologia com um fim determinado. Aliado a isso, podemos supor que se o propósito do documentário é dar força e apoio às resistências anti-sistêmicas, esse modelo não oferece uma solução confiável, pois permite que os significados vagueiem sem limites pela grade de possibilidades culturais. De fato, qualquer conjunto de imagens é mediado pelo espectador. Porém, a questão é: qual perspectiva levaria tanto à desconstrução do sistema vigente quanto levaria a um mundo mais justo? Pela imposição de ideias revolucionárias corretas e certeiras ou através de abertura crítica e questionamento construtivo?

O surgimento de pensamentos e ações radicais não pode depender de produções que desejam criar monumentos eletrônicos, mas sim na construção de uma base de educação libertária e reflexão crítica no momento de percepção do material audiovisual em questão.

   

revisei, mudei várias coisas e coloquei uns links.