sobre políticas identitárias e lesbiandade política

sobre políticas identitárias e lesbiandade política
13 de abril de 2014 às 17:04

Não é a gente que se identifica como algo ou não. É a sociedade, o patriarcado. Lésbica é uma posição material na sociedade. Não vem da minha mente, vem do que eu vivo. Se eu nascesse negra, não adiantaria eu dizer que sou azul pra opressão deixar de existir.

Não sou eu quem decide se sou mulher ou não: é o patriarcado. Não foi o ‘médico’, foi o patriarcado. O médico só identificou uma característica decidida nesse regime importante pra separar de que forma esses individuos serão explorados, nos produtos de seu trabalho e de seu corpo: reprodução e estupro no casamento, prostituição e demais. Produção de pessoas (que não terminamos de nos emancipar, se derem uma olhada em como os discursos aqui reproduzem o lugar de ‘cuidado’, ao se preocupar mais com outros grupos que consigo próprias).

Essa história de ‘genitalização’ só reproduz a idéia machista que vê mulheres como meros buracos.

Portar buceta significa muita coisa num regime de escravidão chamado Heterossexualidade Compulsória. Significa toda uma sorte de investimentos, de exclusões, é como Wittig chama, de “portar a estrela de Davi”1.

Eu tenho preguiça das políticas identitárias atuais, mas aposto em identidade enquanto vivência. E mulher é uma vivência concreta, não uma decisão da minha cabeça. (No entanto eu entendo considerar-se ‘lésbica’ não mulher como estratégia de lésbicas feministas para se visibilizarem dentro do feminismo, que apagou em nome duma política homogênea. Mas não acho que a idéia de lésbicas radicais ou de wittig era produzir uma política de identidade com a idéia de que ‘lésbicas não são mulheres’. Era apenas uma forma de gritar ao feminismo hegemônico e declarar a independência e autonomia políticas das lésbicas com respeito a um feminismo que as secundarizava, o que considero legítimo).

Não entendo por que tanta reprodução do que nos educaram pra fazer: por um lado pessoas que deixa de se enunciar na sua identidade lésbica porque se relaciona ou relacionou com trans, por outro alguém que comenta que ‘monossexualidades excluem pessoas trans’. Gente! Meu corpo minhas regras! Com respeito a nossas sexualidades tenho direito a excluir quem eu quiser, só me toca quem eu quiser. Não é discriminação! Assim como não é discriminação configurar espaços lésbicos, é estratégia de resistência, política e de ataque a toda essa merda.

Por outro lado, se assumem categorias despolitizadas inventadas por discursos sexológicos e psiquiátricos, como panssexual, e coloque o que quiserfobia. Caindo em individualismo: “a sociedade não decidirá o que eu sou”. Perdendo de vista o ponto da questão. Colocando tudo em termos de lutas sexuais. É preciso ver como surgiu essa colonização, onde e por que, por que as lutas feministas foram colonizadas por sexualidade. É dos interesses gays-masculinos, das agendas internacionais de Aids que patrocinam organizações feministas, é interesse do neoliberalismo. 2

Ser lésbica é mais que agarrar mulher. Ser lésbica é viver uma condição política, de desobediência e refugiadas políticas da heterossexualidade como regime político. Ser lésbica é mais que agarrar qualquer pessoa que não seja nascido homem ou que não se vista como tal, ser lésbica é as políticas e éticas de amor às lésbicas e às mulheres e criação de laços como forma de sabotar e destruir esse sistema.

Portanto, não é identidade simplesmente, é mais que mera identidade individual a conviver pacificamente junto a outras como pan, inter, trans, pomo, queer, bi, sado, whatever3. Lésbica não é oprimida/reprimida porque é uma prática sexual tão somente. Lésbicas são punidas, dizimadas e desaparecidas, censuradas e contra-propagandeadas porque são um coletivo em resistência e ataque à Supremacia Masculina. Ser lésbica é como Cheryl Clarke4 colocava: um ato político e coletivo (um coletivo) de resistência.


1 Monique Wittig, texto “Ninguém nasce mulher”. Peço que busquem ler Wittig como materialista, porque se faz uma leitura idealista de Wittig, quando ela diz que lésbicas não são mulheres, é em relação a um contexto específico do movimento lésbico com relação ao movimento de mulheres na frança. Recomendo o texto “Feminismo e lesbianismo Radical” da Frente Lésbica Radical francesa.

2 Para uma crítica ao conceito de fobia, buscar Sarah Lucia Hoagland: Mulher Povo Colonizado. Ela diz que esse conceito despolitiza e surgiu da psiquiatria, e que heterossexismo coloca a raíz políitca do problema. Celia Kitinzger tem um livro inteiro pra criticar a noção de diversidade sexual, e sua raíz histórica na tentativa da heterossexualidade compulsoria por meio da Psicologia e Psiquiatria, inventar o conceito de ‘orientação sexual’ para impedir que mulheres concebam a possibilidade de escolher mulheres. O livro se chama “The Social Construction of Lesbianism”

3 O LGBThjdwahjwdhjwahdhwa….

4 Cheryl Clarke, Lesbianismo: Um ato de resistência. Pode ser encontrado no blog politica-sexual.blogspot.com