Uma lista de HQs lésbicas para ler, baixar e comprar

Aberto à contribuições. Lembrem-se que apesar de haver aqui o formato em pdf ou online dos trabalhos, é importante comprar se possível para apoiar as autoras lésbicas, que são bastante marginalizadas e invisibilizadas neste meio. Além de que vale muito a pena adquirir estes trabalhos. Foram listados apenas trabalhos produzidos por LÉSBICAS e MULHERES na arte e roteiro


As produções da mestra Alison Bechdel são indispensáveis e todas lésbicas deveriam buscar ler, uma vez que também a autora fez parte ativa da construção da cultura lésbica nos anos 80 e 90 e documentou esses momentos históricos em suas tiras publicadas em jornais feministas (pois os grandes jornais não publicariam uma lésbica feminista crítica, apesar de que quadrinistas gays tinham algum espaço). “Dykes to watch out for”, “Fun Home” e “Você é a minha mãe?” são seus títulos publicados. O primeiro são as tiras que produz desde os anos 80 retratando a comunidade lésbica feminista estadunidense é seu trabalho mais icônico e mais focado na existencia lésbica. No começo da coletânea de todas suas tiras o livro “Absolute Dykes to Watch out For” (publicado em espanhol recentemente como " Lo indispensable de unas lesbianas de cuidado"), Bechdel retratava a comunidade feminista radical lésbica e as diferentes formas de ser lésbica ali, representada no circulo de amigas. Ao longo dos anos vai mostrando as modificações nessa comunidade com o aparecimento do queer e a coptação das lésbicas por reformismos. A personagem Mo é evidentemente o alter ego da Bechdel, consistindo numa lésbica que problematiza tudo e assiste essas mudanças com senso crítico ou pessimismo. Os outros dois são graphic novels autobiográficas com trabalho artístico excepcional, onde ela fala da relação com seu pai (Fun Home) e sua infancia e adolescência lésbica, e no “Você é minha mãe?” fala da relação com sua mãe. Trazem muito a questão butch de forma especial pois a autora desde sua infância não performava feminilidade.

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HOTHEAD PAISAN homicidal lesbian terrorist de Diane diMassa. Sobre uma lésbica serial killer de machos, é uma personagem que ficou insana com a misoginia do mundo. Ela tem um prazer em matar homens e tem um gato. A HQ foi banida em muitos lugares por seu conteúdo gore e violento, é de comédia mas também produz bastante angústia com a realidade que traz sobre o sentir-se lésbica raivosa no mundo masculino.

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Roberta Gregory “Bitchy Butch The World angriest dyke”. Quadrinista marginal, nesta hq traz uma personagem butch separatista dos 70, que possui muita raiva do mundo e muito mau-humor, detestando todo mundo hetero à sua volta e se lamentando pelos tempos perdidos do separatismo lésbico num mundo cada vez mais decadente e com a ruína das comunidades lésbicas.

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“Azul é a cor mais quente” de Julie Maroh. A adaptação cinematográfica infeliz e heterossexista que a própria autora repudiou trouxe como vantagem que a obra fosse publicada no Brasil. É uma belíssima obra, com uma arte muito bonita, conta uma história melancolica trazendo a tona a lesbofobia vivida por casais lésbicos, mostrando também os conflitos que vivem lésbicas no cenário político da Europa com o ressurgimento de direitas fascistas.

Enterro das minhas ex de Anne Gauthier. Graphic Novel sobre o processo difícil de descobrimento da autora como lésbica, o choque do desejo lésbico com a realidade heteronormativa e o silêncio sobre essa existência, o título se refere às lesbofobias vividas em seus primeiros relacionamentos, cujo livro parece ser escrito/desenhado de modo a contar sua história ao mesmo tempo em que lida com e supera esse passado por meio da arte.

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Anfibia Sarcastica de Raposa (www.instagram.com/raposarte), publicado na rede Tapas de quadrinistas independentes no formato de webcomics, também tem a versão em zine que ela vende em feiras e eventos e será disponibilizada na loja Ugra de hqs underground em fevereiro. As tiras como a autora diz, visam utilizar o humor como ferramenta reflexiva e autocrítica sobre existência lésbica, desde o viés lésbico radical da autora.

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“Na ponta da língua” da Beliza Buzollo, ilustradora brasileira que produz tiras sobre vida, sexualidade e afetividade lésbica.

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Lesbilais, da ativista lésbica feminista Victoria Rubio Meneses, são tiras que a autora publica há alguns anos no Chile, em forma de tiras, retratam e questionam a vida lésbica e seus aspectos políticos como amor romântico, parejismo (tendência a relações fusionais), o lesbian drama e outros entraves para a expressão de uma existência lésbica autonoma e livre.

*acompanhe online no site lesbilais.com.

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Sapatoons queerdrinhos de Lin Arruda, são zines produzidos por uma “sapatrans” que abre espaço para publicação de outras artistas lésbicas, homens trans e mulheres bi. Sobre corpos lésbicos, butch e transmasculinidades, e essas existências nos cenários feministas.

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Melaço é organizado por Lita Hayata, é um projeto de publicar artistas com histórias breves sobre lesbianidade na plataforma Tapas de webcomics independentes.

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Free Soul (“Espírito Livre” traduzindo) de Yamaji Ebine. É um mangá lésbico (chamado de yuri) com uma história bem sensível, de uma lésbica expulsa de casa que seu sonho é publicar o mangá que está desenhando sobre uma personagem negra lésbica cantora de blues. No Japão as famílias são caretas muitas vezes e não aceitam bem que seus filhos queiram ser artistas e especialmente os mangakás (quadrinistas), pois os mangás tem a fama de ser algo fútil, drama aliás que enfrenta os quadrinhos ao longo da sua história pois ainda batalha pra ser reconhecido como arte. Acho que aqui há a similaridade da condição de quadrinista e lésbica como à margem da normatividade.

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Mangá de trama psicológica sobre uma lésbica tomboy (andrógina) chamada Rio, com depressão e tendências suicidas, quadros psíquicos que ao longo da trama são relacionados ao panorama familiar de abandono e indiferença que vive. Rio se envolve com uma colega de classe onde ambas desenvolvem uma relação de dependência mútua, o que retrata de certo modo a realidade de muitas relações lésbicas de apoio, ameaçadas pelo mundo, e as consequências da privação afetiva para o apego nessas relações.

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Heathen, de Natasha Alterici, é uma publicação sobre uma heroína viking lésbica. “Heathen” quer dizer pagão ou herege, que é uma referência à impostura da personagem principal Aydis, mulher viking que se rebela contra as tradições da sua comunidade. A heroína, que sempre exerceu atividades não-femininas, dentre elas aprendendo a lutar como uma guerreira, é expulsa da sua comunidade após ter sido flagrada beijando uma mina. Sua amante foi condenada a casar com um homem. Em ostracismo, a personagem busca encontrar uma das Valquírias dos mitos que ouvia na infância, condenadas a uma maldição pelo deus Odin a perder sua imortalidade e casar com um mortal. Por desobedecer o patriarcado deístico de Odin, essa que fora a rainha das valquírias está em uma montanha selada por um fogo, de onde apenas sairá quando alguém com bravura suficiente puder passar por essas chamas. Aydis busca libertar essa valquíria e com ela todas as mulheres das tradições patriarcais e anti-lésbicas.
Os vikings foram erroneamente representados com capacetes com chifres, isso se deu pelos cristãos que perseguiam as religiões pagãs e representaram estes como demônios. A personagem principal sabendo disso, assume esse lugar de heresia e coloca os chifres em seu capacete de guerreira segundo os rumores cristãos, também para intimidar os inimigos com o aspecto demoníaco. Daí o nome da obra, fazendo referência a essa questão também, traz também a perseguição das bruxas com o avanço do cristianismo.

A história é realmente muito legal tendo muitas referências simbólicas à luta contra a lesbofobia e é o mito de superação heróico da jornada lésbica pelo mundo.

A arte é muito bela na paleta de cores e especialmente pelo aspecto “sketchy” (rascunhado) que é também contestar os padrões de “finas artes” das hq de heróis, segundo li da própria autora em entrevista.
Longe de ser dramático e trágico, a HQ é cheia de humorismo, expressividade, e otimismo, fugindo das narrativas lésbicas dramáticas.
Para amantes de universos de fantasia e RPG, é muito envolvente.

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Uma sensível novela gráfica sobre o despertar da lesbiandade numa adolescente. Skim das irmãs Mariko Tamaki e Jillian Tamaki, é uma graphic novel sobre uma menina colegial oriental gótica que pratica wicca, e se apaixona pela professora num cenário de adolescência colegial um tanto “13 reasons why” em meio ao suicídio de um aluno. A arte é maravilhosa e te insere numa atmosfera delicada. Me fez pensar nas “metodologias do silêncio” da escritora lésbica Susan Hawthorne. A vivência silenciosa e inomeável dessa experiência de ser lésbica num mundo heteronormativo. O estilo das autoras é único em como aliam narrativa e uma arte cinematográfica e subjetivista, tratando de forma sutil temáticas densas e complicadas da adolescência.

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(Conhece algum trabalho não citado? Contribua comentando ou editando a lista!)

GLOSSÁRIO :

comics: quadrinhos em inglês. Vem do termo cômico, pela origem nas charges.

comic shop: loja especializada em quadrinhos

charge: uma ilustração satírica visando ironizar muitas vezes momentos políticos atuais

banda desenhada: termo em português para hq.

graphic novel: novela gráfica, ou seja a história em quadrinhos. Geralmente se refere a um “one shot”, uma história única, não expressa em série, uma narrativa gráfica publicada com começo meio e fim num único volume e geralmente vendida em livrarias por isso.

hq: história em quadrinhos, também chamada arte sequencial, que alia ilustração à um roteiro, está entre a literatura e a arte plástica não sendo nem apenas um e nem apenas outro, visa contar uma história por meio de imagens e palavras.

historieta: hq em espanhol

mangá: quadrinho oriental, geralmente japonês (também tem coreano e chinês, manwhua e manhua, o estilo é parecido mas alguns são coloridos e a arte as vezes é melhor e mais ousada nesses outros países), é lido da direita para a esquerda (exceto pelas publicações chinesas que tem sentido ocidental) no sentido dos quadros e das páginas, geralmente é preto e branco e valoriza expressividade emocional dos personagens e por isso os “olhos grandes”.

one shot: uma história de volume único, que se diferencia das revistas publicadas em bancas que nunca tem fim (como os super heróis da Marvel) ou séries que tem um determinado número de episódios que você vai adquirindo, lendo por capítulos ou volumes.

yuri: segmento dos mangás voltados para histórias de temáticas lésbica. Mangás possuem segmentos específicos divididos pelo público consumidor. No entanto nesta categoria em é difícil achar trabalhos que representem lésbicas que não sejam femininas e heteronormativizadas, além de ser difícil encontrar representações de gordas e outras etnias.

webcomics: quadrinhos publicados no formato virtual. formato que vem sendo muito utilizado por artistas independentes, mas também é geralmente monetarizado, disponibilizado em streaming de quadrinhos ou plataformas de webcomics gratuitas.